12 outubro 2009

O legado de Che Guevara
Analisando sua obra falada, escrita e vivida, podemos identificar um profundo humanismo. O ser humano era o centro de todas as suas preocupações

Em 8 de outubro cumpre-se o aniversário do assassinato de Che Guevara pelo exército boliviano. Após sua prisão, em 8 de outubro de 1967, foi executado friamente, por ordens da CIA. Seria ''muito perigoso'' mantê-lo vivo, pois poderia gerar ainda mais revoltas populares em todo o continente.

Decididamente, a contribuição de Che, por suas idéias e exemplo, não se resume a teses de estratégias militares ou de tomada de poder político. Nem devemos vê-lo como um super-homem que defendia todos os injustiçados e tampou coexorcizá-lo, reduzindo-o a um mito.

Analisando sua obra falada, escrita e vivida, podemos identificar em toda a trajetória um profundo humanismo. O ser humano era o centro de todas as suas preocupações. Isso pode-se ver no jovem Che, retratado de forma brilhante por Walter Salles no filme Diários de Motocicleta, até seus últimos dias nas montanhas da Bolívia, com o cuidado que tinha com seus companheiros de guerrilha.

A indignação contra qualquer injustiça social, em qualquer parte do mundo,escreveu ele a uma parente distante, seria o que mais o motivava a lutar. O espírito de sacrifício, não medindo esforços em quaisquer circunstâncias, não se resumiu às ações militares, mas também e sobretudo no exemplo prático. Mesmo como ministro de Estado, dirigente da Revolução Cubana, fazia trabalho solidário na construção de moradias populares, no corte da cana, como um cidadão comum.

Che praticou como ninguém a máxima de ser o primeiro no trabalho e o último no lazer. Defendia com suas teses e prática o princípio de que os problemas do povo somente se resolveriam se todo o povo se envolvesse, com trabalho e dedicação. Ou seja, uma revolução social se caracterizava fundamentalmente pelo fato de o povo assumir seu próprio destino, participar de todas as decisões políticas da sociedade.

Sempre defendeu a integração completa dos dirigentes com a população. Evitando populismos demagógicos. E assim mesclava a força das massas organizadas com o papel dos dirigentes, dos militantes, praticando aquilo que Gramsci já havia discorrido como a função do intelectual orgânico coletivo.

Teve uma vida simples e despojada. Nunca se apegou a bens materiais. Denunciava o fetiche do consumismo, defendia com ardor a necessidade de elevar permanentemente o nível de conhecimento e de cultura de todo o povo. Por isso,Cuba foi o primeiro país a eliminar o analfabetismo e, na América Latina, a alcançar o maior índice de ensino superior. O conhecimento e a cultura eram para ele os principais valores e bens a serem cultivados. Daí também, dentro do processo revolucionário cubano, era quem mais ajudava a organizar a formação de militantes e quadros. Uma formação não apenas baseada em cursinhos de teoria clássica, mas mesclando sempre a teoria com a necessária prática cotidiana.

Acreditar no Che, reverenciar o Che hoje é acima de tudo cultivar esses valores da prática revolucionária que ele nos deixou como legado.

A burguesia queria matar o Che. Levou seu corpo, mas imortalizou seu exemplo.

Che vive! Viva o Che!
BRASIL DE FATO - 08/10/2009
por Michelle Amaral da Silva última modificação 08/10/2009 14:59
Colaboradores: João Pedro Stedile BRASIL DE FATO
João Pedro Stedile é membro da coordenação nacional do MST e da Via Campesina.
Publicada em: 07/10/2009
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Laranjas e Gente

A imagem aérea de um trator derrubando uma fila de pés de laranja em um gigantesco laranjal parece chocar mais certos setores da sociedade do que avisão de milhares de pessoas sem terra e suas famílias acampadas precariamente sob tendas de plástico preto na beira de várias estradas brasileiras.

Não pretendo dizer com isso que os fins justifiquem os meios, mas após o choqueinicial do poder da imagem disseminada pelos meios que costumam demonizar aluta pela terra, é bom procurar se informar do que realmente aconteceu e quaisas motivações que geraram o ato perturbador.

Desde o dia 28 de setembro, 250 famílias de sem terra estavam acampadas na fazenda onde a Cutrale, uma das maiores empresas do agronegócio brasileiro, planta laranjas. O objetivo da ação era denunciar a ocupação irregular de terras da União pela Cutrale. O MST afirma que a empresa plantou laranjas na fazenda como forma de legitimar a grilagem de área pública. A produtividade da fazenda não poderia esconder a grilagem como ato ilegal e criminoso.

Muito bem. Esta é a versão do MST e cabe verificar se corresponde à verdade. OIncra confirma que já luta há três anos pela recuperação da fazenda ocupada pela Cutrale, assegurando que pertence à União. De acordo com o instituto, a fazenda integra um conjunto de terras públicas da União que constituíam o antigo Núcleo Colonial Monção.

Ainda segundo o INCRA, o Núcleo Colonial Monção tem sua origem há 100 anos. Foi criado a partir de um grupo de fazendas compradas pela União ou recebidas em pagamento de dívidas da Companhia de Colonização São Paulo/Paraná. Essas fazendas somavam aproximadamente 40 mil hectares, nos municípios de Agudos, Lençóis Paulista, Borebi, Iaras e Águas de Santa Bárbara.

A primeira ocupação na região ocorreu em 1995, e dois anos depois o INCRA reivindicou a fazenda Capivara, em Iaras, obtendo 30% do imóvel como tutela antecipada,o que resultou, em 1998, na criação do assentamento Zumbi dos Palmares. Em 2007, a Justiça Federal garantiu ao INCRA os 8 mil hectares totais da fazenda.

Verifica-se com isso, que a disputa por estas terras tem mais de 10 anos, e a Cutrale se instalou nelas há cerca de cinco anos. Ou seja, tinha conhecimento de que o governo as considerava públicas e mesmo assim levou adiante o seuprojeto de plantio de laranjas. Apesar da origem centenária do núcleo, a Cutrale informa que tem a posse legal das terras. Depois que a Justiça concedeu a reintegração de posse à Cutrale, no último dia 29, portanto um dia após a destruição dos pés de laranja, o Incra entrou com petição na Justiça Federal contra a decisão, com base no argumento de que a área de 40 mil hectares pertence à União.

O que se deduz, então, é que a Cutrale plantou suas laranjas em terras reivindicadas pela União para efeito de reforma agrária. Nesse sentido, a lutado MST é duplamente justa. Primeiro, como denúncia de grilagem em terras públicas e depois pela própria terra para assentar trabalhadores.

Pode se questionar a forma de ação do MST, mas sem ela não teria vindo à tona a ocupação e uso ilegal de terras públicas. A bancada ruralista no Congresso aproveitou rapidamente a comoção causada pelas imagens para aprovar relatório da senadora e latifundiária Kátia Abreu abrandando as exigências de produtividade para que uma fazenda não seja desapropriada para reforma agrária.

Em outra frente de ação, tenta ressuscitar uma CPI para investigar os repasses de recursos públicos a entidades ligadas ao MST. Se o Congresso brasileiro realmente se interessa em saber o que se passa no campo poderia criar uma CPI para verificar a legalidade de todas as propriedades agrícolas do país e exigir sua imediata devolução em caso de grilagem.
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Esclarecimentos sobre últimos episódios veiculados pela mídia
Sexta feira , 9/9/2009

Diante dos últimos episódios que envolvem o MST e vêm repercutindo na mídia, a direção nacional do MST vem a público se pronunciar.
1. A nossa luta é pela democratização da propriedade da terra, cada vez mais concentrada em nosso país. O resultado do Censo de 2006, divulgado na semana passada, revelou que o Brasil é o país com a maior concentração da propriedade da terra do mundo. Menos de 15 mil latifundiários detêm fazendas acima de 2,5mil hectares e possuem 98 milhões de hectares. Cerca de 1% de todos os proprietários controla 46% das terras.
2. Há uma lei de Reforma Agrária para corrigir essa distorção histórica. No entanto, as leis a favor do povo somente funcionam com pressão popular. Fazemos pressão por meio da ocupação de latifúndios improdutivos e grandes propriedades, que não cumprem a função social, como determina a Constituição de1988.

A Constituição Federal estabelece que deve ser desapropriadas propriedades que estão abaixo da produtividade, não respeitam o ambiente, não respeitam os direitos trabalhistas e são usadas para contrabando ou cultivo de drogas.
3. Também ocupamos as fazendas que têm origem na grilagem de terras públicas, como acontece, por exemplo, no Pontal do Paranapanema e em Iaras (empresa Cutrale), no Pará (Banco Opportunity) e no sul da Bahia (Veracel/Stora Enso). São áreas que pertencem à União e estão indevidamente apropriadas por grandes empresas, enquanto se alega que há falta de terras para assentar trabalhadores rurais sem terras.
4. Os inimigos da Reforma Agrária querem transformar os episódios que aconteceram na fazenda grilada pela Cutrale para criminalizar o MST, os movimentos sociais, impedir a Reforma Agrária e proteger os interesses do agronegócio e dos que controlam a terra.

5. Somos contra a violência. Sabemos que a violência é a arma utilizada sempre pelos opressores para manter seus privilégios. E, principalmente, temos o maior respeito às famílias dos trabalhadores das grandes fazendas quando fazemos as ocupações. Os trabalhadores rurais são vítimas da violência. Nos últimos anos, já foram assassinados mais de 1,6 mil companheiros e companheiras, e apenas 80assassinos e mandantes chegaram aos tribunais. São raros aqueles que tiveram alguma punição, reinando a impunidade, como no caso do Massacre de Eldorado de Carajás.
6. As famílias acampadas recorreram à ação na Cutrale como última alternativa para chamar a atenção da sociedade para o absurdo fato de que umas das maiores empresas da agricultura - que controla 30% de todo suco de laranja no mundo - se dedique a grilar terras. Já havíamos ocupado a área diversas vezes nos últimos 10 anos, e a população não tinha conhecimento desse crime cometido pela Cutrale.

7. Nós lamentamos muito quando acontecem desvios de conduta em ocupações, que não representam a linha do movimento. Em geral, eles têm acontecido por causada infiltração dos inimigos da Reforma Agrária, seja dos latifundiários ou da policia.

8. Os companheiros e companheiras do MST de São Paulo reafirmam que não houve depredação nem furto por parte das famílias que ocuparam a fazenda da Cutrale. Quando as famílias saíram da fazenda, não havia ambiente de depredações, como foi apresentado na mídia. Representantes das famílias que fizeram a ocupação foram impedidos de acompanhar a entrada dos funcionários da fazenda e da PM, após a saída da área. O que aconteceu desde a saída das famílias e a entrada da imprensa na fazenda deve ser investigado.

9. Há uma clara articulação entre os latifundiários, setores conservadores doPoder Judiciário, serviços de inteligência, parlamentares ruralistas e setores reacionários da imprensa brasileira para atacar o MST e a Reforma Agrária. Não admitem o direito dos pobres se organizarem e lutarem.

Em períodos eleitorais, essas articulações ganham mais força política, como parte das táticas da direita para impedir as ações do governo a favor da Reforma Agrária e "enquadrar" as candidaturas dentro dos seus interesses de classe.
10. O MST luta há mais de 25 anos pela implantação de uma Reforma Agrária popular e verdadeira. Obtivemos muitas vitórias: mais de 500 mil famílias de trabalhadores pobres do campo foram assentados. Estamos acostumados a enfrentaras manipulações dos latifundiários e de seus representantes na imprensa.

À sociedade, pedimos que não nos julgue pela versão apresentada pela mídia. NoBrasil, há um histórico de ruptura com a verdade e com a ética pela grande mídia, para manipular os fatos, prejudicar os trabalhadores e suas lutas e defender os interesses dos poderosos.

Apesar de todas as dificuldades, de nossos erros e acertos e, principalmente,das artimanhas da burguesia, a sociedade brasileira sabe que sem a Reforma Agrária será impossível corrigir as injustiças sociais e as desigualdades no campo. De nossa parte, temos o compromisso de seguir organizando os pobres do campo e fazendo mobilizações e lutas pela realização dos direitos do povo à terra, educação e dignidade.
São Paulo, 9 de outubro de 2009
DIREÇÃO NACIONAL DO MST