07 março 2008

8 de Março que não termina


Quase Fora Yeda!

* As manifestações das mulheres da Via Campesina,
* A Marcha das Mulheres em Porto Alegre,
* A nota do Sindicato dos Jornalistas denunciando as medidas repressivas da Brigada Militar contra as camponesas e o direito da sociedade à informação,
* O artigo do eminente advogado Jacques Alfonsin provando a ilegalidade da ação repressiva e dos negócios da papeleiras multinacionais;
* E a informação do Tribunal Superior Eleitoral confirmando que a governadora Yeda Crusius recebeu doações vultosas das papeleiras para sua campanha eleitoral.

Um dia de luta das mulheres do campo e da cidade

À repressão violenta e a prisão das mulheres e crianças em Rosário, os militantes do MST reagiram fechando oito pontos rodoviários do estado. Em Porto Alegre, uma das manifestações das camponesas aguardou a chegada da governadora ao teatro São Pedro, onde ela reunia uma seleta platéia para comemorar o Dia da Mulher.

Uma mulher no meio da platéia se levantou no inicio da atividade e mostrou o que vira a ser daquelas terras se o modelo das papeleiras for adotado. Como um seio seco de uma mulher que pretender alimentar seu filho e não conseguem, as terras daquela região se contaminarão e secarão. Os seios secarão, os filhos ficarão esqueléticos ainda na tenra idade, todos mortos de fome pela terra esgotada, pela água que diminuiu e foi contaminada.

Para elas o modelo de exploração daquela região pelas papeleiras destruirá o solo e a água daquela e de outras regiões, pois é água do Aqüífero Guarani, reserva de água doce que se encontra no subsolo da região que abrange metade do Brasil, o Uruguai, a Argentina e o Paraguai.

A reação das mulheres da Yeda no teatro São Pedro foi de ódio de classe, gritando para que aquela imagem desaparecesse de seus olhos.
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O fato histórico

O fato histórico do 8 de março de 2008 foi a luta das mulheres camponesas organizadas na Via Campesina. Ao ocuparem a Fazenda Tarumã, da empresa finlandesa Stora Enso, em Rosário do Sul, revelaram o compromisso do governo e da governadora Yeda Crusius com as papeleiras multinacionais que planejam transformar a fronteira oriental do sul do país num mar de eucaliptos.

A violenta repressão que se seguiu visou, segundo uma camponesa, ocultar o objetivo da manifestação: marcar o Dia Internacional da Mulher, o início da jornada nacional de lutas das mulheres da Via Campesina contra o agronegócio e ocultar a informação do Tribunal Superior Eleitoral que as três principais empresas de celulose em atuação no Rio Grande do Sul doaram juntas quase meio milhão de Reais para a campanha da então candidata Yeda Crusius ao Governo do Estado. Entre elas, a empresa finlandesa acusada de compra ilegal de terras na faixa de fronteira.

Os dados oficiais sobre as doações das papeleiras a governadora são do Tribunal Superior Eleitoral, assim discriminados:

ARACRUZ CELUL. S/A. 42157511003934 18/09/2006 R$1.000,00 Descrição das doações relativas à comercialização;
ARACRUZ CELULOSE S. A. 42157511003934 18/08/2006 R$11.954,72 Recursos de pessoas jurídicas;

ARACRUZ CELULOSE S/A. 42157511003934 05/10/2006 R$16.902,12 Recursos de pessoas jurídicas;
ARACRUZ CELULOSE S/A. 42157511003934 11/10/2006 R$ 51.700,61 Recursos de pessoas jurídicas;

ARACRUZ CELULOSE S/A. 42157511003934 20/10/2006 R$200.000,00 Recursos de pessoas jurídicas;
STORA ENSO BRASIL LTDA. 02424298000192 16/10/2006 R$24.000,00 Recursos de pessoas jurídicas;
VOTORANTIN PAPEL E CELULOSE LTDA. 60643228000121 23/11/2006 R$ 200.000,00 Recursos de pessoas jurídicas.
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Dia 7 de Marcha em apoio às mulheres da Via Camponesas

Dezenas de mulheres sindicalistas, feministas, sexistas, partidárias do Conselho Estadual da Mulher ocuparam a Praça da Matriz, em frente ao Palácio Piratini, do governo estadual, para manifestar as lutas pelo dia Internacional da Mulher e apoio a luta das mulheres da Via Campesina.

Em seguida percorreram o centro de Porto Alegre e encerraram a atividade no largo Glenio Peres. Mas antes entregarem um manifesto ao governo, representado pelo chefe da Casa Civil, Cesar Buzato, cobrando uma série de reivindicações negadas ou mal feitas pelos serviços públicos do estado. A governadora não se dispôs a receber as manifestantes.

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A nota do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS
Na semana em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul denuncia o impedimento, por parte da Brigada Militar, do exercício profissional de jornalistas na cobertura da ocupação, pelas mulheres da Via Campesina, da Fazenda Tarumã, em Rosário do Sul. Repórteres fotográficos e cinematográficos foram impedidos de registrar a agressão sofrida por mulheres e crianças que estavam na manifestação, inclusive tendo equipamentos profissionais apreendidos. Outra jornalista foi retirada do local pelos policiais.

Foto: Eduardo Seidl





Jornalista é conduzida pela BM
Vivemos em uma sociedade democrática de direito e não vamos aceitar as velhas práticas do período da ditadura militar. O Código de Ética dos Jornalistas, em seu artigo 2º, inciso V, aponta que "a obstrução direta ou indireta à livre divulgação da informação, a aplicação de censura e a indução à auto-censura são delitos contra a sociedade". O mesmo Código também identifica, no artigo 6º, ser "dever do profissional opor-se ao arbítrio, ao autoritarismo e à opressão".
A Secretaria de Segurança do Estado deve explicações sobre esse fato não só aos jornalistas agredidos no seu direito de trabalhar, mas a toda a sociedade, que foi impedida de ser livremente informada. As constantes denúncias que chegam ao Sindicato revelam que ameaças aos jornalistas têm sido prática constante por parte da Brigada Militar.

O Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS está atento a esse tipo de comportamento e levará o caso à Federação de Periodistas da América Latina e Caribe que, já em sua Carta de Lima, Peru, de dezembro de 2007, exigia dos governos assumir a responsabilidade de garantir a todos os jornalistas o direito à vida, ao trabalho digno, à liberdade de expressão e o direito cidadão à informação.
* Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS
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Da repressão da delinqüência à delinqüência da repressão
Jacques Távora Alfonsin *

Uma empresa transnacional, autorizada por um interdito proibitório, acaba de obter violenta desocupação de uma de suas fazendas, no Rio Grande do Sul, contra mulheres camponesas que tinham ingressado na mesma, em protesto contra o uso e a exploração da terra que ela promove neste Estado. Entrevistado sobre a forma como agiu, a autoridade policial responsável pela repressão, disse que “delinqüente é delinqüente.”

O protesto daquelas mulheres, porém, segundo suas próprias palavras, se inspirou na defesa da vida, do meio-ambiente, da segurança nacional garantida pela faixa de fronteira estabelecida na Constituição Federal (arts. 20 § 2º e 91, § 1º inc. III). Faixa essa violada pela tal empresa, que já é possuidora de imóveis rurais situadas na mesma, em território gaúcho, valendo-se até de empresas brasileiras “laranjas” para burlar a proibição constitucional. Amparo legal para proceder como procederam, então, embora a maioria da mídia tenha escondido isso, não faltava àquelas mulheres.

O meio-ambiente, como o art. 225 da mesma Constituição Federal reconhece, é “bem de uso comum do povo” o que legitima qualquer cidadã/o para defendê-lo, inclusive com o uso da própria força, se o artigo 188, inciso I do Código Civil for respeitado. Ali está previsto que não constituem atos ilícitos “a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão à pessoa, a fim de remover perigo iminente.” Mais do que estranheza, pois, do ponto de vista rigorosamente jurídico, gera espanto o fato de que um interdito proibitório obtenha um reconhecimento equivalente ao da licença para ameaças e agressões que a referida empresa praticar no Rio Grande do Sul sobre seu solo, imunizando-a antecipadadamente de qualquer questionamento que se possa fazer contra os maus tratos da terra que a sua posse e propriedade vierem a deflagrar.

O eucalipto é uma árvore e, como tal, não é de admirar o fato de que ele não tenha consciência da quantidade de água e de comida que o espaço terra por ele exigido, no Rio Grande do sul, vai tirar da sua população, mas é de causar indignação mais do que justificada o fato de o Poder Público, especialmente Judiciário e Executivo, com raras exceções, não considerarem como perigo atual, mais do que iminente, o que isso pode significar de impacto ambiental, de aumento da fome, da falta de teto e da pobreza que assolam o meio rural gaúcho, preferindo reprimir como delinqüentes mulheres que lutam contra a delinqüência, essa sim, de quem desrespeita a vida, o meio-ambiente e até as leis do país, costumeiramente interpretadas e acomodadas em favor dos seus interesses e do seu lucro.
· Advogado - Mestre em Direito pela Unisinos.

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