09 dezembro 2007

Governo Yeda





Trabalhadores tratados como bandidos e movimento criminalizado

Os trabalhadores organizados no Movimento dos Trabalhadores Desempregados, MTD, ocuparam, na manhã do dia 28 de novembro, o prédio da estatal em processo de desativação da Cooperativa Riograndense de Laticínios e Correlatos – CORLAC, em Porto Alegre. A ação de ocupação do prédio abandonado e com equipamentos em processo de deterioração visava sensibilizar a Governadora Yeda Crusius a receber os desempregados e atender algumas reivindicações, a principal delas, a criação de 2,5 mil postos de trabalho já aprovados para o orçamento de 2007 pelos deputados estaduais.
Desde que assumiu, o atual governo recebeu os membros do MTD em uma única reunião, com o Secretário do Desenvolvimento Social, Fernando Schuler, isso depois de fazerem 16 ocupações e diversos protestos, de abril a setembro de 2007. Nesta reunião, o secretário acenou com projeto para 2008 e 2009, pedindo paciência, pois o governo não tinha dinheiro. Entretanto, a Secretaria da Fazenda gastou R$173 milhões para criar vagas em prisões, e isto é 70 vezes mais do que o MTD reivindica para criar 1500 postos de trabalho em 2007.

Negociação
Logo que houve a ocupação, na manhã do dia 28, o governo e representantes do MTD, iniciaram negociação. A chefia da Casa Civil, Luiz Fernando Zachia, aceitou receber os representantes do MTD em troca da desocupação do prédio.
Quatro horas depois, quando estava tudo acertado e os trabalhadores se preparavam para retornar ao acampamento, o Batalhão de Operações Especiais da Brigada Militar invadiu o local e impôs outro procedimento.

Choque
As imagens levadas ao ar por emissora de televisão local, mostrando o grupo sendo tratado como bandidos, chocou a população. Mas, depois de levadas ao ar, as imagens e o assunto não tiveram mais destaque na imprensa local, e, daí em diante, ficaram as preocupações com aquelas famílias e seus filhos lutando por trabalho. E, as mensagens do MTD não tiveram divulgação para dizer o que de fato aconteceu.
A tentativa de caracterizar o grupo que luta por emprego como marginal foi da política da Secretaria de Segurança do estado. Enquanto a Casa Civil negociava, o comando do Batalhão de Operações Especiais da Brigada tratou a todos como bandidos: Cara no chão, mãos para trás, fala quando “eu” mando, mesmo observando que tinha crianças e respectivas mães e pais no local. Não foi dito o que estava acontecendo nem o crime que estava sendo praticado.
Postos na rua e em fila, cerca de 800 desempregados foram cercados por 2000 soldados. Tentaram separar os homens das mulheres. Não deu certo.
As crianças foram levadas para um ônibus. As mães avisadas de que se não os acompanhassem, seriam entregues ao Conselho Tutelar. Assim, foram separados mães e filhos dos demais trabalhadores e levados para o Departamento Estadual da Criança e do Adolescente (Deca), sem que fossem avisados de que estavam sendo levados para lá.
Os outros, cerca de 700 trabalhadores, iniciaram caminhada em direção ao acampamento, no Parque Harmonia, mas cercados por 2 mil brigadianos foram escoltaram para delegacias diferentes. Os considerados como lideranças foram levadas para a 9ª Delegacia. Os demais, para a 4ª.
Em frente à 4ª, policiais e brigadianos queriam que entrassem na garagem do prédio, sob alegação de que estavam atrapalhando o trânsito. Mas, mesmo de fora, os desempregados viam que lá dentro foram colocados foices, enxadas e outros instrumentos agrícolas que não eram deles. Negaram-se e sentaram no chão da calçada.
Então, velhos e os mais novos foram levados aos gritos, com gestos violentos, para dentro da delegacia para prestarem depoimento.
Dentro da delegacia, a alegação para prender todos foi a necessidade da polícia verificar se não havia entre os desempregados nenhum foragido.
As perguntas formuladas pelos policiais, sempre em voz alta, eram se moravam perto de alguma “boca”, se conhecia algum bandido.
A cada vez, todos protestavam como podiam. E foram liberados.

Seguem as negociações
Na tarde do dia 28, depois da delegacia os representantes do MTD se reuniram com o chefe da Casa Civil, Fernando Záchia, como tinham combinado, que prometeu recursos para o Movimento, sem especificar valores, e os encaminhou para audiências, primeiro com a Fundação Gaúcha do Trabalho e Ação Social – FGTAS -, e depois com o Secretário de Justiça e Desenvolvimento Social, mas advertiu que a solução do problema estava na liberação de recursos a ser feito pela Secretaria da Fazenda.
O presidente da FGTAS, o vereador do PMDB de Canoas, Nedy de Vargas Marques, propôs criar 60 postos de trabalho, 4% do pretendido pelos desempregados. Os dirigentes do MTD mostraram que se o governo destinasse 2% do recurso gasto para construir cadeias poderia criar 2500 postos de trabalho, dentro das possibilidades orçamentárias já aprovadas pela Assembléia Legislativa.
O MTD reivindicou também recursos para os projetos de combate ao desemprego em 2008.
A audiência seguinte do MTD era com o Secretário de Justiça e Desenvolvimento Social. Mas, ao se dirigirem lá, os portões do prédio daquela secretaria foram fechados impedindo que a equipe do MTD pudesse sequer chegar perto da portaria para dizer que estavam cumprindo o acordo acertado com o chefe de gabinete da governadora.
No dia 28, os trabalhadores do MTD protocolaram carta (abaixo) a governadora Yeda Crusius e, no dia 29, ao secretário da Fazenda, Aod Cunha.

A luta continua
As imagens feitas a partir de um helicóptero, mostrando o grupo marchando escoltado por brigadianos, como se fossem marginais, não afetou o espírito de luta dos integrantes do MTD.
Os trabalhadores do MTD do Rio Grande do Sul já têm agendado seminário com entidades do movimento social para avaliar a Marcha dos Sem – ocorrida no último dia 30 - e a luta por emprego no estado. Os trabalhadores não estão desempregados porque querem, e estão convencidos de que o governo tem que atendê-los da mesma forma que atende os grandes empresários.

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As cartas do MTD a governadora Yeda Crusius e ao Secretário da Fazenda do RS são as seguintes:

MOVIMENTO DOS TRABALHADORES DESEMPREGADOS – MTD

A governadora do estado do Rio Grande do Sul
Sra. Yeda Rorato Crusius
Porto Alegre 28 de Novembro de 2007
Desejamos conversar com a mulher e mãe Yeda Crusius, que hoje cumpre a responsabilidade de ser governadora das/os gaúchas/os. Somos 2 mil e 500 famílias de desempregadas/os organizadas/os no MTD no RS (90% mulheres chefes de família), espalhadas/os de Norte a Sul do estado. Lutamos para que, auto-organizados, nós desempregadas/os possamos trabalhar em nossos próprios Grupos de Produção, estudar e nos manter organizadas/os em nossas comunidades, e, assim, contribuir com o desenvolvimento social e econômico de nossas cidades e nosso estado. Sabemos que a cada família que ganha o direito de consumir bens básicos a sobrevivência, isso aquece a economia local. Uma alimentação adequada evita gastos com o SUS. Uma alternativa digna de geração de renda evita gastos com segurança pública. Famílias bem-estruturadas evitam gastos com repetência escolar, e assim por diante. Entretanto, sem investimentos públicos, nosso esforço todo se esvai na luta pela sobrevivência na periferia. Por isso, buscamos que o estado contribua dando o suporte básico inicial para iniciarmos este ciclo virtuoso de combate ao desemprego e sua cadeia de mazelas correlatas.
Inexplicavelmente, estamos desde o início de 2007 sem nenhum suporte do governo estadual. Nem mesmo alimentos. Sabemos que o estado precisa de novas medidas para elevar sua capacidade de investimento. Mas mesmo com o pouco que se tenha, há sempre uma margem de liberdade para os gestores definirem suas prioridades. Nós do MTD não aceitamos que o governo tenha gasto (segundo a própria Secretaria da Fazenda) R$170 milhões com “Mais Vagas em Prisões” e mais de R$4 bilhões sob a rubrica “Encargos Especiais” e diga que não tem nenhum recurso para investir nos projetos das/os desempregadas/os. O citado acima é um recurso que já foi gasto, portanto, real, não fictício, como alegam os agentes do governo sobre o Orçamento 2007. Isso sem contar os 14,5 milhões previstos para se realizar a mudança da administração central do estado do Palácio Piratini para o Centro Administrativo.
Por tudo isso, exigimos do governo do Estado que saia da ilegalidade e cumpra imediatamente a Lei n.º 11.628/01 que prevê a execução das Frentes Emergenciais de Trabalho para desempregados organizados no RS, para a qual está reservado no Orçamento de 2007 em torno de R$2,5 milhões. Tal valor seria suficiente para se liberar a parcela dos benefícios previstos na Lei para os 2,5 mil desempregados referente ao mês de Dezembro. Tal valor não chega a 2% dos gastos já realizados com “Mais Vagas em Prisões” ou 0,05% do já liquidado com os chamados “Encargos Especiais”. Além do mais, a liberação de Frentes de Trabalho foi promessa de campanha da governadora, e muitos desempregados apoiaram-na e a seus aliados crentes nesta promessa. Não cumpri-la significa quebrar para sempre a confiança daqueles que um dia os apoiaram.
Propomos também que o governo emende a Proposta Orçamentária de 2008, reservando 1% do previsto para os “Encargos Especiais” para políticas de combate ao desemprego baseadas nas propostas dos próprios desempregados organizados. Assim, seria possível garantir o cumprimento das FETs iniciadas em 2007 e dar ainda um fundamental passo a frente. Temos uma proposta, já apresentada ao governo no mês de abril através do Secretário Záchia chamada “Pontos Populares de Trabalho”, que prevê a garantia de condições materiais essenciais a auto-sustentação dos desempregados, acabando com sua dependência de novos recursos estatais. Detalhes da proposta assim como informações acerca dos grupos já formados, e dos equipamentos e matérias-primas que estes precisam foram passados à SJDS no dia 10/08/2007 através de Maurício Cruz e Carla Zito. Mas estamos dispostos a debater em detalhes a proposta com a governadora e o próprio secretário Fernando Schuler.
Sabemos que governos e seus aliados vivem de eleições. Em 3 anos haverá nova eleição estadual e ano que vem já haverá eleições municipais. Estejam certos de que os agentes que não demonstrarem estar de fato ao lado dos desempregados, fazendo publicamente a luta junto conosco, sofrerão desgastes políticos irretocáveis por não estar ao lado das/os desempregadas/os. Toda sociedade quer combater o desemprego e será crítica a todos que negarem esforços nesse sentido. A sociedade gaúcha está com o MTD. Quem não está ao lado dos Desempregados, está contra a sociedade gaúcha. Este governo já tem apenas 16% de aprovação segundo pesquisa divulgada pela RBS. Seus agentes tendem a ficar cada vez mais isolados se não ouvirem os anseios da população em ver aumentadas as verbas para as áreas sociais.
Afinal, o tema de maior preocupação da sociedade brasileira é o desemprego e nenhum ator é mais respeitado em nossa sociedade do que mães trabalhadoras. O MTD tem convicção de que oferece ao estado propostas que, com baixíssimos custos, podem gerar inestimáveis estoques de capital e desenvolvimento social e econômico para o RS. Não temos dúvida de que, com o baixíssimo investimento que os desempregados organizados exigem, todo o estado sairá ganhando. Sem sua realização, porém, todo o estado sairá perdendo. Mas sem dúvida, quem mais perderá serão os agentes hoje ligados ao governo do estado que terão sua imagem desgastada ao demonstrar insuficiente boa vontade em superar o problema que mais aflige a grande maioria da população.

Atenciosamente,
Movimento dos Trabalhadores Desempregados/RS.

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Ao Secretário Estadual da Fazenda
Sr. Aod Cunha

Porto Alegre 29 de Novembro de 2007

Nós trabalhadores e trabalhadoras desempregados (as) organizadas (os) no Movimento dos Trabalhadores Desempregados, vindos de várias cidades do Rio Grande do Sul, entre elas: Palmeira das Missões, Caxias do Sul, Pelotas, Bagé, Lajeado, Sapiranga, Novo Hamburgo, São Leopoldo, Canoas, Alvorada, Viamão, Eldorado do Sul, Gravataí e Porto Alegre, queremos com esta carta, sensibilizar o Senhor Aod Cunha, atual Secretário Estadual da Fazenda do Rio Grande do Sul, para que dê encaminhamentos concretos acerca de nossas reivindicações. Somos 2 mil e 500 famílias de desempregadas/os organizadas/os no MTD espalhadas/os de Norte a Sul do Estado, dos quais em torno de 90% são mulheres chefes de família.
Desde ontem estamos mobilizados para reivindicar o cumprimento de direitos já conquistados em lei, através de nossa organização e mobilização. Ao reivindicar condições para trabalhar, fomos tratados como criminosos. Os problemas sociais que a sociedade gaúcha enfrenta devem ser tratado com responsabilidade e não como crime. A liberdade de expressão e manifestação foram confundidas com crime. Os cerca de 800 trabalhadores e trabalhadoras foram levados à Delegacia de Polícia para prestar depoimentos, sendo tachados como criminosos, segundo entrevista do comandante geral da operação.
Ao sermos recebidos, ao final da tarde, pelo Chefe da Casa Civil, Fernando Záchia, o mesmo assumiu o compromisso de executar imediatamente o Programa das Frentes Emergenciais de Trabalho, ainda neste ano de 2007, como a própria imprensa gaúcha divulgou. No entanto, para que o Programa seja de fato executado, é necessário que o Secretário da Fazenda Aod Cunha libere os recursos financeiros.
Este é objetivo pelo qual estamos aqui. Queremos a garantia do Secretário Aod, que liberará os recursos sendo que estão previstos R$ 2.500.000,00 no orçamento estadual de 2007.
Lutamos para que, auto-organizados, nós desempregadas/os possamos trabalhar em nossos próprios Grupos de Produção, estudar e nos manter organizadas/os em nossas comunidades, e assim, contribuir com o desenvolvimento social e econômico de nossas comunidades, diminuindo os índices de violência que estão postos sobre as nossas populações. Sabemos que a cada família que ganha o direito de consumir bens básicos a sobrevivência, aquece a economia local. Uma alimentação adequada evita gastos com o SUS. Uma alternativa digna de geração de renda evita gastos com segurança pública. Famílias bem-estruturadas evitam gastos com repetência escolar, e assim por diante. Entretanto, sem investimentos públicos, nosso esforço todo se esvai na luta pela sobrevivência na periferia.
Nós do MTD não aceitamos que o governo tenha gasto (segundo a própria Secretaria da Fazenda) R$ 170 milhões com “Mais Vagas em Prisões” e mais de R$ 4 bilhões sob a rubrica “Encargos Especiais” e diga que não tem nenhum recurso para investir nos projetos das/os desempregadas/os. O citado acima é um recurso que já foi gasto, portanto real, não fictício, como alegam os agentes do governo, sobre o Orçamento 2007. Isso sem contar os 14,5 milhões previstos para se realizar a mudança da Administração Central do Estado do Palácio Piratini para o Centro Administrativo, o que, na nossa opinião é um gasto totalmente desnecessário.
Sabe-se que o tema de maior preocupação da sociedade brasileira é o desemprego e nenhum ator é mais respeitado em nossa sociedade do que mães trabalhadoras. O MTD tem convicção de que oferece ao Estado propostas que, com baixíssimos custos, podem gerar desenvolvimento social e econômico, minimizando problemas sociais que recaem sobre toda a sociedade. Não temos dúvida de que, com o baixíssimo investimento que os desempregados organizados exigem, todo o estado sairá ganhando, caso contrário, somos nós, os desempregados e desempregadas que continuaremos arcando com os custos das mazelas sociais que vivemos diariamente.
Ao finalizar queremos reafirmar a extrema urgência de nossa reivindicação ser atendida e para tal queremos a garantia desta Secretaria de que nossa organização e mobilização não seja tratada como caso de polícia e que as condições imediatas para a geração de trabalho e renda sejam assumidas pelo Estado do Rio Grande do Sul. Portanto, isto significa a imediata liberação de recursos financeiros para as nossas Frentes de Trabalho Estaduais.
Atenciosamente,
Movimento dos Trabalhadores Desempregados/RS.

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